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segunda-feira, 15 de agosto de 2011


“MOON NÃO DESISTE DO BRASIL”
         A seita comandada pelo reverendo Sun Myung Moon – o mesmo que se autoproclama em alto e bom som o novo messias da Humanidade – cresce no Brasil. A milionária organização comandada pelo controvertido coreano está investindo pesado na Fazenda New Hope, em Jardim (MS), onde pretende construir um Jardim do Éden (á época da publicação da matéria), com templo, escolas, universidade e alojamentos. Quase dois anos depois de cooptar pastores brasileiros no Uruguai (estratégia denunciada com exclusividade na edição nº 6 de VINDE, em abril de 1996), o cristo amarelo mostra suas novas táticas. Além de empregar Mao de obra local, fez doação de 29 ambulâncias a municípios da região. Contudo, muitos de seus seguidores que trabalham de sol a sol na fazenda são mantidos em regime de semi-escravidão, sem salário ou direitos trabalhistas. – Jornal o Globo, 31/08/1997.

Fonte: Revista Vinde, Ano II – nº 23, p.11 - Outubro de 1997

O JARDIM DA SEITA DE MOON
         O sul coreano Sn Myung Moon, 77 anos( a época da publicação da matéria, hoje conta com aproximadamente 91 anos de idade)[1], autoproclamado o novo messias da humanidade, está usando uma parte de sua fortuna na pequena Jardim, cidadezinha de 20 mil habitantes[2], a 260 Km de Campo Grande (MS). O “senhor do segundo advento”, como seus discípulos costumam se referir ao líder máximo do Movimento da Unificação –seita fundada por ele e seguida por 10 milhões de adeptos em 156 países -, resolveu construir um novo paraíso no Centro –oeste brasileiro. É lá que a organização está lançando as bases da reedição do  Jardim do Éden, lugar descrito no livro do Gênesis, onde viveu o primeiro ser humano, Adão justamente aquele de quem o reverendo Moon se diz ser legítimo sucessor, sem se esquecer de Jesus Cristo que de acordo com os ensinamentos da Unificação, fracassou na sua missão redentora por não haver constituído família na terra. A fazenda New Hope(Nova Esperança), de propriedade  da seita, é a sede do projeto, cuja primeira fase prevê a construção de um templo, seis escolas, uma universidade e alojamentos para mil visitantes.
         Não é a primeira vez que Moon e seus seguidores fazem incursões no Brasil. No começo da década de 80, a Associação do Espírito Santo para Unificação do Cristianismo Mundial (mas tarde rebatizada de Federação da Família pela paz Mundial), organização  religiosa internacional liderada pelo coreano, ficou famosa no país mais por questões policiais do que religiosas. Acusado de aliciamento de menores, trabalho escravo, formação de milícia e lavagem cerebral, o grupo foi alvo de inquéritos movidos pela Polícia Federal e pelo extinto Dops. Nada ficou provado, mas desde então os moonistas passaram a ter atuação discreta, dirigida de sua sede nacional, no bairro de Pinheiros, em São Paulo. O aparente silêncio foi quebrado no começo do ano passado (1996), quando passaram para ações ostensivas e estrategicamente conjugadas.
        Discretamente, a organização adquiriu terras em Jardim, onde montou sua base. Paralelamente, desfechou intensa atividade ideológica. Atraiu até Montvidéu, no Uruguai, mas de 3 mil pastores e líderes evangélicos brasileiros, no episódio denunciado acima, que ficou conhecido como a “cilada da Unificação” – seminários intensivos onde princípios doutrinários da seita foram expostos de maneira dissimulada, na  tentativa de reduzir a resistência dos evangélicos, um dos grupos mas avessos de Moon.
         A escolha não foi por acaso. Nestes congressos, líderes da Unificação deixaram bem claro que a seita elegeu a América Latina como teatro de suas operações neste fim de século, e o Brasil figura como ponta-de-lança da empreitada. Segundo o próprio Moon, a estratégia faz parte do “plano providencial para a América Latina”. Ele pretende salvar, à sua maneira, o mundo, nem que para isso, precise investir bilhões. “O revendo está disposto a gastar o que for preciso para realizar esse sonho”, confirma o engenheiro César Zaduski, ex-presidente da Unificação no Brasil e até hoje um de seus líderes mais influentes.

Sushis e ambulâncias
        Conseguir seus objetivos a peso de ouro é uma tática antiga de Moon. De 30 de agosto a 8 de setembro(1997), Campo Grande viu uma pequena amostra do seu império, avaliado em U$$ 8 bilhões: a II Exposição Internacional do World Unification Group, o braço globalizado da seita, por onde jorra um faturamento anual superior a U$$ 500 milhões( à época). O grupo da Unificação atua, entre outros, nos ramos da indústria automobilística, naval, farmacêutica, construção pesada formática, pesca e química. Estava lá, na exposição da avenida Calôgeras, farta propaganda de todas essas áreas de atuação. Os visitantes, que preenchiam uma ficha de identificação, concorriam a prêmios de aparelhos eletrônicos e, se quisessem, degustavam, de fresquíssimos e deliciosos sushis.
         Não foi a primeira manifestação  de opulência e generosidade para impressionar os sul-matogrossenses. No dia 13 de agosto, Moon, e sua mulher, Hak Já Han, entregaram pessoalmente 29 ambulâncias, compradas por R$ 650 mil numa concessionária local, a prefeituras do estado. Houve que não aceitasse como prefeitura de Campo Grande, mas a presença de centenas de pessoas, parte delas certamente atraída pela comida farta e gratuita, animou muito os “verdadeiros pais”,  titulo conferido ao casal pelos seus seguidores.
         No dia 4 de setembro, nova bocalivre foi oferecida. Apesar de ter sua presença anunciada, Moon não deu as caras, mas foi representado por um de seus braços direitos no Brasil, o coreano Yoon Sang Kim, que recitou a mensagem d principio divino. – livro que contém doutrinas supostamente reveladas por Deus a Moon, entre as quais a de  que a humanidade só pode ser salva através dos matrimônios celebrados por ele(ver quando nesta página). Kim não perdeu a oportunidade de tecer loas ao “terceiro Adão” e anunciar que investimentos maciços serão feitos no estado, começando por Jardim, a curto e médio prazo.
        Kim está adubando a primeira semente do tal “plano providencial”. A New Hope de Jardim – há outras com o mesmo em diversos países e haverá outras mais na região – teve 250 hectares compradas no começo do ano passado. De lá para cá, segundo o coreano, mais cinco fazendas foram compradas em Jardim, Porto Murtinho, Guia Lopes e Miranda, somando uma área continua de 16 mil hectares, pelos quais serpenteiam dois dos rios mais importantes de região, o Miranda e o Perdidos.
         Embora ainda falte muita coisa, os moonistas estão entusiasmados com os resultados até aqui. “Poucas pessoas aqui na cidade têm preparação psicológica para receber uma multinacional dessas”, diz, com orgulho dissimulado, o dono de funerária e ex-vereador Luis Ribas, escolhido para ser o representante de Moon e de Kim no centro urbano de Jardim. Sua casa hospeda dezenas de estrangeiros que transitam na New Hope, aos quais ele trata com a intimidade apropriada a um recém-convertido. Virou também um espaço disputado por eleitores pobres em busca de cestas básicas, remédios e outros favores do messias. Ao que parece, o que motivas Ribas a ser discípulo de Moon não apenas devoção: ganhou de presente da seita um Tempra zerinho.
         Ribas aconchegou-se à seita por conta dos dólares que estão mexendo com a economia de Jardim. “No inicio, todo mundo enganava o presidente Kim, vendendo terras muito acima do preço justo”, diz Ribas. Certamente, ele não leu mais que meia dúzia das 392 páginas do Principio Divino, mas isso não faz  a menor diferença, nem o impediu de receber, por ordem de Kim, a agradável tarefa de administrar os muitos negócios que a seita multinacional já fez e anda fazendo por lá, como a compra de terras, tarefa a que se entrega com afinco. Chega a pagar R$ 300 mil por hectare, fazendo jus a comissões pelo trabalho. Figura conhecida em Jardim, Ribas já perdeu uma eleição para prefeito, mas admite abrir mão de seus projetos políticos para se dedicar de corpo e alma à seita. “Os planos que eles têm para mim são muito maiores do que ser prefeito de uma cidadezinha. Afinal, este é um projeto mundial”, garante.
Escândalo
         “Temos U$$ 100 milhões para investir aqui nos próximos 5 anos”, diz Kim, ciceroneado pelo incansável Zaduski, moonista há 20 anos e protagonista dos escândalos que marcaram a história da seita no país: era ele o presidente nacional da organização da época. Moon tem Zaduski na mais alta conta. É o homem chave na organização dos eventos internacionais, como a farra evangélica no Uruguai, juntamente com Simão Feroboli, manda chuva da matriz brasileira da seita, em São Paulo. César Zaduski minimiza os efeitos das investigações policiais, há mais de 15 anos. “Tudo só serviu para que eu ficasse amigo do doutor Romeu Tumas”, comenta, referindo-se ao ex-diretor da Polícia Federal e atual Senador.
         Dos U$$ 100 milhões prometidos para região de Jardim, U$$ 10 milhões já foram para nas mãos dos fazendeiros que toparam vender suas terras a preços bem acima do mercador. Outro tanto comprou a sede de um banco e um hotel em Miranda. Kim garante:   os milhões da multinacional irão construir ali o maior templo da seita no mundo, de 60 mil metros quadrados, onde funcionará uma universidade. O paraíso terá ainda um hotel de mil quartos e indústrias madeireira e de pescado, além de um extenso pomar.  “Não está claro o que eles vieram fazer aqui, e por isso todo mundo está apreensivo”, diz um fazendeiro que tem receio de se identificar. O prefeito de Jardim, Márcio Campos Monteiro(PMDB), resume a situação: “O que temos de real é que as terras adquiridas pela seita podiam estar ocupadas por pastagens, mas se tornaram ociosas nas mãos deles”.
         Alheios a toda a polêmica, os adeptos da seita continuam chegando de todos os cantos do mundo a New Hope. Nesta versão cabocla da Torre de Babel, há representantes de 45 países: indianos, japoneses, coreanos, canadenses, ingleses, dinamarqueses e até nepalês. Uma etapa importante de seu plano de salvação planetária acontece no próximo dia 28 de novembro (1997): o megacasamento de 6 milhões de casais – 100 mil só no Brasil, segundo César Zaduski. Para que isso seja possível, o evento megalômano será transmitido pelo mundo via satélite.
Um ‘messias’ cheio de contradições
        O reveredno Sun Myung Moon é um obstinado que insiste em proclamar-se “ senhor do segundo advento” –sucessor de Jesus Cristo na sua obra de salvação dos homens. Apesar de já ter sido considerado louco e fanático, Moon, conseguiu arregimentar mais de 10 milhões de seguidores mundo a fora. Todos eles acreditam que o líder recebeu de Deus, em 1936, os ensinos contidos no livro Principio Divino, considerado mais sagrado do que a Bíblia. Entre suas doutrinas, os escritos de Moon afirmam que a morte na cruz determinou o fracasso de Cristo, que deveria ter se casado e constituído família.
         O casamento é um dos pilares da seita, única forma possível de se ter comunhão com Deus. Por isso, o reverendo Moon realiza, periodicamente, cerimônias gigantescas, unindo milhares de pessoas em todo o mundo. Os pares são escolhidos por ele, através de fotografias, e na maioria dos casos os noivos só se conhecem  no momento da cerimônia. O nascimento virginal de Cristo também é rechaçado: Moon afirma que Maria concebeu devido a uma relação sexual. Os adeptos da Unificação fazem suas preces em nome do verdadeiro pai como é chamado  o líder - , e não de Jesus.
         A vida pessoal de  Sun Myung Moon é tão conturbada quanto seus ensinos. Apesar de ensinar a indissolubilidade do matrimônio, já está no quarto casamento. Apregoa a paz mundial, mas possui uma indústria de armamentos que produz, entre outros, o mortífero fuzil M-16. Já passou 11 meses numa prisão americana, condenado por sonegação fiscal. Ao redor do mundo, suas igrejas são acusadas de promover desde lavagens cerebrais até trabalho escravo. Recentemente, a exemplo do que já fizeram outros países, o governo da Venezuela proibiu as atividades dos moonistas. Contudo, nada parece impedir a expansão do movimento, que, como uma fortuna avaliada em U$$ 8 bilhões, continua seduzindo muita gente.

Uma arapuca no Uruguai
         Moon sabe que um dos maiores obstáculos à sua atuação no Brasil é a aversão que desperta no segmento evangélico, cada vez mais influente no país. Sabendo disso, e disposta a tirar os crentes do seu caminho, a Associação do Espírito Santo para a Unificação do Cristianismo Mundial – ou, simplesmente, seita Moon – promoveu,d e fevereiro a abril de 1996, uma série de conferências em Montevidéu, no Uruguai, cujos convidados era exclusivamente pastores e líderes, representando cerca de 50 denominações e grupos evangélicos.
        Denunciado com exclusividade por VINDE na edição nº 6, a estratégia dos moonistas consistia em atrair centenas de crentes até o Uruguai com passagens aéreas pagas, hospedagem nos melhores hotéis e passeio ao balneário de Punto Del Leste. Deu certo: nas cinco conferencias mais de 3 mil evangélicos compareceram alguns sem saber do que se tratava o evento, realizado no luxuoso hotel Victória Plaza, pertencente a Moon. Outros foram se aproveitar da boca livre, mas houve gente que se mostrou seduzida pelos ensinos da Unificação. Os organizadores conseguiram relativo sucesso, dissimulando afrimações mais perigosas e antibiblicas. Além disso, contaram com a colaboração providencial de pastores como Obede Viana e Paulo de Carvalho, da Assembleia de Deus, que agiram como intermediários no convite feito a igrejas de todo o Brasil. O episódio chegou a virar matéria no programa Fantástico, da Rede Globo, escandalizou o meio evangélico.

[1] O número citado e da é poça em que foi publicado a  matéria.
[2]  Idem.

 Fonte: Revista Vinde, Ano II, nº 24, pp.,60 a 63.
Advertência: O conteúdo postado é de inteira responsabilidade de seus autores. Cabendo aos mesmos provar a veracidade das informações.

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