SUBSÍDIOS TEOLÓGICOS - DISCIPLÍNA: SÍNTESE DO NOVO TESTAMENTO
Professor: Gilberto Rezende
FORMA LITERÁRIA
CARTA OU EPÍSTOLA?
A escrita de cartas
há muito fora usada como um meio de comunicação. Contudo, foi durante a época
da Pax Romana que a escrita de cartas se tornou uma importante forma de
comunicação. Foi devido ao vasto Império Romano que, durante o tempo da
formação do Novo Testamento, havia um excelente sistema de estradas por todo o
mundo ocidental. Essas estradas estavam sob constante proteção do governo
romano e permitiam viagem relativamente segura entre as principais cidades do
Império. Roma não tinha correio público per se, mas os mensageiros, tanto
particulares quanto governamentais, podiam viajar com alguma garantia de chegar
a seu destino. A forma de comunicação escrita era necessária tanto no governo
como no comércio. Era apenas natural que as famílias e amigos dispusessem deste
meio de, um ao outro, fazerem conhecidos seus negócios. As cartas particulares
formam uma grande parte dos manuscritos antigos que foram encontrados pelos
arqueólogos modernos.
As cartas não
somente eram usadas para a comunicação oficial, comercial ou particular. A
carta era também usada para fins de propaganda. "Cartas abertas" eram
escritas para informar o público acerca de certos itens dignos de nota. Algumas
dessas tinham o efeito dos modernos "boletins públicos." A palavra
grega para estes "anúncios públicos", (proegra/fh), foi usada por Paulo em Gálatas 3:1,para indicar a
natureza pública da proclamação da morte do Senhor Jesus Cristo. Cícero, um dos
escritores romanos de cartas mais prolíficos (c. 106 a.C.), fazia uma distinção
entre as cartas que escrevia para uso particular e aquelas para uma leitura
mais pública. Ele escreveu: "Vocês vêem, eu tenho uma maneira de escrever
o que acho que será lido por aqueles a quem envio minha carta, e outra maneira
de escrever o que acho que será lido por muitos" (citado em R.P. Martin, New
Testament Foundations, II, p. 242),
Adolf Deissmann (Lighth
from the Ancient East — Luz do Oriente Antigo, 1910) usou as
palavras de Cícero, para demonstrar uma diferença definida entre as formas de
uma "carta genuína" e uma "epístola". Ele procurou mostrar
que uma "carta genuína" era pessoal e dirigida a uma pessoa referente
a um problema da situação específica. Não haveria absolutamente nenhum
pensamento acerca de ser feita uma leitura mais extensiva, a não ser por
aqueles a quem a carta estava endereçada. "Epístolas", contudo, eram
dispositivos literários com uma audiência maior de leitores em mente. A
"epístola" era escrita sob o pretexto de ser uma "carta"
pessoal, com a finalidade expressa de ser publicada. Isto quer dizer que o autor,
enquanto endereçava a carta a uma pessoa ou entidade específica, não estava
tanto escrevendo para essa pessoa ou entidade quanto estava usando a forma para
fazer conhecido ao mundo seu argumento. Este gênero de escrita ou composição
literária é denominado "epistolar". Deissmann, com esta teoria,
procurou mostrar que as "Epístolas" do Novo Testamento, e especial as
de Paulo, eram, na verdade, "cartas particulares", e não
"epístolas". É de maneira geral aceito hoje que Paulo não escreveu
conscientemente neste sentido técnico. Ele escreveu para pessoas ou igrejas
específicas, com problemas específicos. Contudo, vê-se facilmente que as
"cartas" de Paulo demonstram a autoridade apostólica consciente, que
torna os conteúdos normativos para igrejas e pessoas de outras áreas e épocas.
As "cartas" são bem construídas, para demonstrarem um plano
cuidadosamente elaborado. Elas são "cartas particulares" quanto ao
tom, ao espírito e ao propósito; contudo, ao mesmo tempo, elas são obras-primas
de composição. A extensão média das cartas particulares naquela época era de
cerca de noventa palavras, e a epístola tinha a média de 200 palavras. A carta
mais curta de Paulo, Filemom, tem 335 palavras, e a mais extensa, Romanos,
7.101. A média de Paulo é de cerca de 1.300 palavras para todas as suas cartas.
Neste sentido, as cartas de Paulo não podem incidir dentro da categoria normal
de uma carta regular. Os teores de suas cartas pressupõem algo além de uma
carta particular normal. Deve ser acrescentado que os escritos de Paulo têm
toda característica de uma "carta particular", mas a universalidade
dos conteúdos fez com que eles fossem classificados sob o termo técnico de
composições literárias conhecidas como "epístolas".
MÉTODO DE COMPOSIÇÃO
O secretário
profissional entrou em proeminência durante a época do elevado interesse nas
comunicações pessoais e comerciais. Nas famílias mais abastadas e em casas
comerciais, provavelmente um escravo bem instruído seria o "secretário
particular". Normalmente, contudo, a maior parte das cartas era escrita
por um escriba profissional, chamado amanuense. Se a carta era um tanto
extensa, o amanuense provavelmente colocaria o ditado numa forma de
taquigrafia e posteriormente o transcreveria numa forma mais requintada. O
remetente então colocaria sua assinatura e encarregaria um mensageiro, através
de quem a carta seria enviada. Se o mensageiro fosse um amigo de confiança,
talvez o remetente lhe daria alguma outra informação ou instrução para entrega
oral pessoal (ver Ef. 6:21,22; Col. 4:7,8).
A carta usual
começaria com o nome do remetente e um título que o identificaria ao receptor,
cujo nome também apareceria na saudação introdutória. Então seguiria a saudação
normal de "alegria" ou "graça" (os judeus usavam o termo "paz").
Uma oração de graças e petição pelo receptor seria então escrita. Depois do
corpo da carta, as saudações finais seriam escritas pela mão do remetente, se
possível. Como o secretário público era Comumente pago pelo número de linhas,
consistindo de dezesseis a vinte letras, a maioria das cartas eram bem curtas.
A tinta era geralmente de tipo inferior e tinha que ser molhada constantemente.
O papel era de papiro, numa forma enrolada. O amanuense escrevia
no rolo de papiro e o cortaria no número de "páginas"
necessárias. As cartas de uma página seriam, então, enroladas e dobradas,
depois amarradas e seladas com cera.
Fonte:
Introdução ao Estudo do Novo Testameto
Autor: Boadus
David Hale
Editora: JUERP